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19 de Maio de 2024

A audiência por videoconferência nos processos judiciais

há 4 anos

Já nas décadas de 80 e 90 as máquinas de escrever foram substituídas pelos computadores, o que proporcionou mais rapidez na elaboração das peças processuais; a internet possibilitou a consulta processual sem a necessidade da utilização das maquininhas quadradinhas que existiam nas sedes dos Tribunais para a impressão dos “boletos” com o andamento processual, e a constante ida aos cartórios judiciais para acesso dos autos do processo que repousavam tranquilamente em uma das pilhas de documentos dos escaninhos dos juízos. Como se vê, o avanço das tecnologias permitiu uma melhoria na prestação jurisdicional, que continua a evoluir nos dias atuais a medida que avança a implementação da digitalização dos processos físicos e a sua substituição pelo processo eletrônico.

Desse modo, os avanços da tecnologia nos séculos 20 e 21 também trouxeram suas influências para o âmbito dos Tribunais do país, principalmente com a ampliação da utilização dos computadores e da internet que repercutiram para a formação do processo judicial eletrônico, inicialmente regulamentado pela lei 11.419/06 que se aplica aos processos civil, trabalhista, penal e aos processos dos juizados especiais, cujo intuito foi o de desburocratizar o procedimento mediante a utilização dos atos de comunicação processual e de transmissão de documentação por meio digital, de modo a torná-lo mais célere atendendo ao postulado constitucional da razoável duração do processo (art. , inc. LXXVIII, da CF).

Como diz MARCELO MESQUITA SILVA (Processo Judicial Eletrônico Nacional: Uma visão prática sobre o processo judicial eletrônico nacional (A certificação digital e a lei n 11419/06) São Paulo: ed. Milenium, 2012, pág. 13) “O processo eletrônico visa à eliminação do papel na tramitação das mais diversas ações, afastando a tradicional realização dos atos mecânicos, repetitivos, como o ato de protocolar uma inicial, a autuação do processo, a numeração de folhas. Acaba a tramitação física dos autos a distribuição para a secretaria (ou cartório), desta para o gabinete do promotor ou do magistrado, e a necessidade de cargas dos autos. Facilita a comunicação dos atos processuais com a intimação de advogados e de partes, realizada diretamente no sistema. Agiliza a confecção de mandados, ofícios, publicações, expedição de precatórias, cartas de ordem e outros.” (RAYSSA MAYARA CAMPOS. O Processo Eletrônico Realmente Veio Para Resolver o Andamento Dos Processos Judiciais?. disponível em https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-processual-civil/o-processo-eletronico-realmente-veio-para-resolveroandamento-dos-processos-judiciais/).

De qualquer forma, as mudanças são realizadas de forma gradual para a necessária adaptação e compreensão pelos usuários dos novos sistemas colocados a sua disposição pelo Poder Judiciário, a quem incumbe desenvolver os sistemas eletrônicos de processamento de ações judiciais por meio de autos total ou parcialmente digitais, utilizando, preferencialmente, a rede mundial de computadores e acesso por meio de redes internas e externas (art. da lei 11.419/06). Somente nas hipóteses de comprometimento do acesso à justiça é que a forma eletrônica deve ser preterida, como quando, por motivo técnico, for inviável o uso do meio eletrônico para a realização de citação, intimação ou notificação (art. , § 2º, da lei 11.419/06).

No ano de 2009, a lei 11.900 promoveu alterações no Código de Processo Penal (Decreto-Lei 3.689/41), para permitir a possibilidade de realização de interrogatório do acusado e outros atos processuais por videoconferência, como a oitiva de testemunha e a acareação, o reconhecimento de pessoas e coisas e a tomada de declarações do ofendido (art. 185, §§ 2º a e art. 222, § 3º, do CPP). Em 2010, o Conselho Nacional de Justiça regulamentou, na Resolução nº 105, a documentação dos depoimentos por meio do sistema audiovisual e a realização de interrogatório do acusado e a inquirição de testemunhas por videoconferência.

O novo Código de Processo Civil (lei 13.105/2015) traz, em seu texto, diversos dispositivos relacionados a prática de atos eletrônicos, como: artigo 193, que trata dos atos processuais que podem ser total ou parcialmente digitais, de forma a permitir que sejam produzidos, comunicados, armazenados e validados por meio eletrônico; artigo 194, que trado dos sistemas de automação processual que deverão respeitar a publicidade dos atos, o acesso e a participação das partes e de seus procuradores, inclusive nas audiências e sessões de julgamento, observadas as garantias da disponibilidade, independência da plataforma computacional, acessibilidade e interoperabilidade dos sistemas, serviços, dados e informações que o Poder Judiciário administre no exercício de suas funções; artigo 197, parágrafo único, que trata da configuração da justa causa do artigo 223, caput e § 1º, nos casos de problema técnico do sistema e de erro ou omissão do auxiliar da justiça responsável pelo registro dos andamentos do processo eletrônico; artigos 198 e 199, que tratam do acesso e da acessibilidade do sistema e dos documentos nele constantes pelo Poder Judiciário; artigo 209, §§ 1º e 2º, que trata da digitalização dos atos e termos do processo e da assinatura digital; artigo 213, que trata do tempo da prática dos atos eletrônicos que pode ocorrer em qualquer horário até as 24 (vinte e quatro) horas do último dia do prazo; artigo 228, § 2º, que trata da juntada de petições ou de manifestações em geral nos processos eletrônicos que ocorrerá de forma automática, independentemente de ato de serventuário da justiça; artigo 231, inciso V, que trata do dia do começo do prazo recaindo no dia útil seguinte à consulta ao teor da citação ou da intimação ou ao término do prazo para que a consulta se dê, quando a citação ou a intimação for eletrônica; artigo 232, que trata da informação pelo juiz deprecado ao juiz deprecante por meio eletrônico da realização da citação ou da intimação por carta precatória, rogatória ou de ordem; artigo 236, § 3º, que admite a prática de atos processuais por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real; artigo 246, inciso V e § 1º, que trata da citação eletrônica; artigo 263, que trata das cartas de ordem e precatória eletrônica; artigo 270, que trata da intimação eletrônica; artigo 285, que trata da distribuição eletrônica; artigo 287 c/c artigo 319, inciso II, que tratam do dever de informar o endereço eletrônico das partes e dos advogados; artigo 334, § 7º, que autoriza a realização da audiência de conciliação e de mediação por meio eletrônico; artigo 367, §§ 4º, 5º e 6º, que dispõe sobre a gravação da audiência e da audiência de instrução nos processos eletrônicos; artigo 385, § 3º, que trata do depoimento pessoal por meio eletrônico; artigos 439 a 441, que tratam dos documentos eletrônicos; artigo 453, §§ 1º e 2º, que trata da oitiva de testemunha por meio eletrônico; artigo 460, que trata da documentação eletrônica do depoimento da testemunha; artigo 461, § 2º, que autoriza a acareação de testemunhas por videoconferência ou outro recurso tecnológico; artigo 837, que permite a penhora e a averbação da penhora eletrônica; artigo 879, inciso II, que prevê a alienação de bens por meio de leilão judicial eletrônico; artigo 937, § 4º, que autoriza a sustentação oral por videoconferência ou outro recurso tecnológico; artigo 943, caput, que trata do registro dos atos processuais do Tribunal; artigo 1.007, § 3º, que dispensa o recolhimento do porte de remessa e retorno nos processos eletrônicos; artigo 1.017, § 5º, que dispensa a instrução do agravo de instrumento com peças obrigatórias; artigo 1.108, § 2º, que dispensa a comunicação de interposição do agravo de instrumento ao juiz de origem.

Nas suas disposições finais e transitórias (art. 1.053 do CPC/15), está consignado que os atos processuais praticados por meio eletrônico até a transição definitiva para certificação digital (identificação virtual das pessoas naturais e jurídicas - assinatura digital) ficam convalidados, ainda que não tenham observado os requisitos mínimos estabelecidos pelo Código, desde que tenham atingido sua finalidade e não tenha havido prejuízo à defesa de qualquer das partes, em respeito a instrumentalidade das formas (art. 188 c/c art. 277 e 282, § 1º, do CPC). Isso porque, o Código de Processo Civil anterior (lei 5.869/73) já previa a prática dos atos processuais de forma eletrônica (art. 154, parágrafo único e § 2º), em razão das alterações promovidas pelo artigo 20 da lei 11.419/06.

Como visto anteriormente, está previsto no Código de Processo Civil (art. 334, § 7º), que a audiência de conciliação e de mediação pode ser realizada por meio eletrônico, de modo que é uma faculdade conferida pelo legislador ao juiz e as partes para que seja verificada a sua viabilidade no âmbito de cada juízo, até porque não é mais obrigatória a realização de audiência somente para conciliação (art. 334, §§ 4º, e , c/c art. 359 do CPC). Um dos recursos tecnológicos disponíveis para a realização da audiência é a videoconferência que permite o contato audiovisual entre pessoas que estão em lugares diferentes, conectadas pela internet, possibilitando a realização da audiência de maneira remota, com interação entre os participantes (Portaria 6.414/20 do TJ/MG), com a utilização de plataforma disponibilizada pelo Poder Judiciário, como o CISCO WEBEX (art. 6º, § 2º, da Res. 314/20 do CNJ).

No mesmo sentido, foi incluído o § 2º ao artigo 22 da lei 9.099/95 para permitir a audiência de conciliação não presencial conduzida pelo Juizado Especial Cível mediante o emprego dos recursos tecnológicos disponíveis de transmissão de sons e imagens em tempo real, devendo o resultado da tentativa de conciliação ser reduzido a escrito. No tocante aos Juizados Especiais Criminais pode-se aplicar subsidiariamente as disposições do Código de Processo Penal relativas aos atos processuais por videoconferência, conforme dispõe o artigo 92 da lei 9.099/95.

No tocante a audiência de instrução e julgamento, as disposições do Código de Processo Civil (arts. 358 a 368 do CPC) são referentes a forma presencial do ato na sede do juízo, com possibilidade de gravação em imagem e em áudio, em meio digital ou analógico, desde que assegure o rápido acesso das partes e dos órgãos julgadores (art. 367, § 5º, do CPC). Portanto, o ato é presencial com documentação do ocorrido por meio eletrônico, ressalvada a possibilidade de depoimento pessoal da parte e de oitiva e acareação de testemunhas por videoconferência (art. 385, § 3º, art. 453, § 1º e 461, § 2º, do CPC), com disponibilização pelo juízo dos necessários equipamentos para a transmissão e recepção de sons e imagens.

Entretanto, o artigo 193 do Código de Processo Civil diz que os atos processuais, nele incluídos as audiências, podem ser total ou parcialmente digitais, de forma a permitir que sejam produzidos, comunicados, armazenados e validados por meio eletrônico, de modo que para as audiências de instrução e julgamento com produção de provas orais menos complexas, como apenas para depoimento pessoal da parte ou oitiva de poucas testemunhas, pode ser adotada a forma eletrônica/videoconferência quando houver manifestação das partes neste sentido após a decisão de saneamento do processo (art. 190 c/c art. 357, incs. II e V, §§ 1º a , do CPC). Nada obstante, quando a prática eletrônica do ato importar em violação ao acesso à justiça (art. , inc. XXXV da CF e art. CPC) ou a paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos (art. 369 do CPC) e faculdades processuais, aos meios de defesa e aos ônus (art. do CPC), as audiências devem seguir a forma presencial, cabendo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório (art. , inc. LV, da CF).

Portanto, os sistemas disponibilizados pelo Poder Judiciário devem garantir o acesso e a participação das partes e de seus procuradores nas audiências e sessões de julgamento por videoconferência, sob pena de nulidade por violação das normas fundamentais do processo. Neste sentido o item 15 do Comunicado CG 284/20 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo dispõe que nos casos de falha de transmissão de dados entre as estações de trabalho serão preservados os atos até então praticados e registrados em gravação, cabendo ao magistrado avaliar as condições para a continuidade do ato, se possível pelo mesmo link, ou sua designação para outra data (art. 363 e 365 do CPC).

Conforme previsto no artigo 15 do Código de Processo Civil, as suas disposições referentes aos atos processuais eletrônicos são aplicáveis supletiva e subsidiariamente quando as normas reguladoras dos processos eleitorais e trabalhistas forem omissas ou insuficientes (art. 769 da CLT), bem como ao processo penal (art. do CPP) e ao procedimento dos Juizados Especiais da Fazenda Pública (art. 27 da lei 12.153/09). No tocante ao processo do trabalho, pode-se aplicar as disposições referentes ao depoimento pessoal da parte e a oitiva e acareação de testemunhas por videoconferência, no intuito de simplificar e agilizar a produção da prova oral ao tornar desnecessário o deslocamento da parte ou da testemunha que resida em outra Comarca, a audiência de conciliação virtual no âmbito dos dissídios coletivos (art. 813, § 1º da CLT) e a audiência de instrução e julgamento por videoconferência quando possível (art. 190 e 193 do CPC c/c art. 841, art. 843, art. 845, art. 846 e 852-C da CLT, e art. 5º, § 6º do ato conjunto 6/20 do TRT1). No tocante ao processo penal também pode-se admitir a audiência de instrução por videoconferência (art. , art. 400, art. 411 e art. 531 do CPP c/c art. 193 do CPC), e em relação aos Juizados Especias da Fazenda Pública está legalmente autorizada a realização da audiência de conciliação por videoconferência (art. 16 e 27 da lei 12.153/09 c/c art. 22, § 2º, da lei 9.099/95, e art. 334, § 7º do CPC).

Em tempos de pandemia da doença do coronavírus (COVID-19), a prática dos atos processuais por meio eletrônico, como as audiências e as sessões de julgamento por videoconferência (Res. 313/20 e 314/20 do CNJ), tem sido a alternativa para evitar a paralisação dos processos, forçando a implementação rápida de mecanismos para garantir a disponibilidade e o acesso dos sistemas aos participantes do processo, de modo que a experiência surtirá efeitos futuros pós-pandemia, quiçá com a ampliação das audiências eletrônicas.

Conclui-se, portanto, que a realização das audiências de forma eletrônica/videoconferência deve visar a celeridade processual ao simplificar a formalidade do ato, com maior praticidade para as partes e para o juiz. Contudo, quando surtir o efeito inverso de dificultar o acesso e a participação das partes e seus representantes, seja por deficiência de estrutura do juízo ao disponibilizar o ambiente e os equipamentos adequados ou por qualquer outro motivo, deve-se manter a forma presencial em respeito a ampla defesa e ao contraditório.

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